O Santo, a Rua e o Rio

Santana do Ipanema tem uma rua chamada São Vicente. É natural que se pense que a denominação esteja relacionada ao Antigo Abrigo para Idosos São Vicente de Paulo, logo na entrada.Fundado pelo Rotary Club, na segunda administração do prefeito Adeildo Nepomuceno Marques, num tempo a rua nem era rua, propriamente dita. Para contar a versão original do nome daquele logradouro, voltemos no tempo e no espaço. À Grécia antiga, 700 anos antes de Cristo.

A cidade de Alba Longa era governada pelo décimo-segundo rei Numitor que seria deposto por um estratagema de seu irmão Amúlio. Para garantir o trono, Amúlio assassinou todos os descendentes varões de Numitor. Sua única sobrinha, uma linda donzela chamada Reia Sílvia, Amúlio obrigaria a se tornar sacerdotisa, consagrada a deusa Vesta. No entanto a sacerdotisa terminou por engravidar do deus Marte. Desta união foram gerados os irmãos Rômulo e Remo, que nasceram a 2 de março de 771 a.C. Como punição Amúlio mandou prender Reia em um calabouço e mandou jogar seus filhos no rio Tibre. Como por milagre, o cesto onde estavam as crianças, acabou atolado em uma das margens do rio, no sopé dos montes Palatino e Capitolino, em uma região conhecida como Cermalus, Não demoraria e acabariam sendo encontrados por uma loba que os levou, e os amamentou a sombra de um pé da Figueira Ruminal (Ficus Ruminalis), na entrada de uma caverna chamada Lupercal. Tempos depois, um pastor de ovelhas chamado Fáustulo encontrou os gêmeos e levou-os para sua casa onde foram criados por sua mulher Aca Laurência.

Na Rua São Vicente, habitava humilde moradia, com seus doze filhos, um cidadão que atendia pelo nome de Jasão Vicente Melquisedeque. Seu Jasão viria a ficar viúvo ao nascer-lhe sua única filha mulher, a caçula Maria Aparecida. Por ser homem temente a Deus, fez voto de castidade, e de tantas romarias a Juazeiro do Norte, para se aconselhar espiritualmente com o padre Cícero, terminou por adotar em definitivo o uso do hábito franciscano. Conhecedor dos poderes medicinais de toda espécie de planta da caatinga, Jasão Vicente proporcionava cura, àqueles que o procurava para que os livrassem de mazelas físicas e encosto do outro mundo, sem que nada fosse preciso ser dado em pagamento. Levava aos extremos quanto aos preceitos religiosos, amplamente arraigados no seio de sua parentela. Aos filhos cobrava que pedissem a benção, pelo menos três vezes ao dia, ao acordar, após as refeições e ao deitar-se, bem como deviam recitar oração nessas ocasiões.

Maria Aparecida, depois da maioridade, arranjou um namorado por nome de Paulo, rapaz sério, honesto e trabalhador, tudo com a aprovação de Seu Jasão, porém aos filhos e a filha, sempre alertava, tinham que se casar virgem. Preferia vê-los mortos a desonra da família. E eis que Maria Aparecida engravidou. Escondeu a gravidez até o dia de ter os filhos, eram gêmeos. Teve-os na barranca do Rio Ipanema, no sopé do serrote da micro-ondas. Abandonou-os a sorte embaixo de um pé de fícus. Uma raposa atraída pelo cheiro de sangue encontrou-os e levou-os pra sua toca, uma gruta que ficava no cume da montanha, logo abaixo do grande rochedo onde tempos mais tarde, fixariam uma estátua de Cristo redentor. O canídeo selvagem havia dado cria, e levou os bebês para alimentar seus filhotes, muito embora mal algum fariam pois eram muitos pequenos e apenas mamavam. Pedro Socó um caçador seguindo o choro das crianças, encontrou-as na toca da raposa e depois de enfrentar o bicho, levou-as pra casa no sopé do serrote do Cruzeiro. Os bebês foram criados por sua esposa, como sendo filhos seus, a eles, dera os nomes de Cosme e Damião.

Voltemos outra vez no tempo. Mais precisamente ao século III d.C. na Arábia. No seio de uma família nobre de pais cristãos, nasceu Cosme e Damião. Ainda meninos foram para a Síria. Ali estudaram medicina e depois a exerceram, em Egéia e na Ásia Menor. Por não receberem qualquer pagamento por isso, eram chamados de anargiros, que quer dizer, inimigos do dinheiro. Diziam: "Nós curamos as doenças em nome de Jesus Cristo e pelo seu poder". Sob a acusação de feitiçaria e de serem inimigos dos deuses romanos, foram perseguidos pelo imperador Diocleciano e por ele trucidados. Na primeira tentativa de matá-los, foram afogados, mas salvos por anjos. Na segunda, queimados, mas o fogo não lhes causou dano algum. Apedrejados na terceira vez, mas as pedras voltaram para trás, sem atingi-los. Por fim, morreram degolados, e seus seguidores transportaram seus corpos para Roma. Cosme e Damião martirizados na Síria. Foram sepultados num templo dedicado a eles, feito pelo Papa Félix IV (526-30), na Basílica de Roma. Aos seus sepulcros, se lê as insígnias SS - Cosme e Damião.

No Cachimbo eterno, em Santana do Ipanema, Cosme e Damião, os filhos adotivos de Pedro Socó, o caçador, crianças ainda, tinham o poder de curar doenças. Eram como o avô, lá da Rua São Vicente, que eles nunca conheceriam. Colhiam em segredo folhas de determinadas plantas na beira do rio Ipanema e produziam um óleo santo que tinha entre outras coisas, o poder de dar filhos às mulheres estéreis. Um dia, os dois irmãos estavam às margens do rio Ipanema, a cata das ditas ervas milagrosas, mais precisamente entre as pedras do Poço dos Homens. Uma fatalidade terminaria por acontecer ali, Cosme numa brincadeira mais violenta acabaria por empurrar o irmão pras correntezas do rio. Damião, nos redemoinhos d’água do poço traiçoeiro, morreu afogado. E Deus vendo tal ato ignóbil deu um castigo a Cosme, se tornaria adulto, entretanto não cresceria, ficaria sempre com corpo de criança. E Cosme deu-se em casamento e todos seus filhos Miguel, Gabriel, Rafael, nasceriam com o estigma do castigo do pai não cresciam, eram todos anões.


Fabio Campos

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