Noite da Luz! Noite de Maria

Maria das Virgens ia ser avó. Sua filha mais velha estava para ser mãe. Na verdade uma criança ia ter outra criança. As três filhas de Das Virgens tinham exatamente oito, treze e quinze anos. Lembrou-se do dia em que ela mesma fora pedida em casamento contava com dezesseis anos de idade. Vinte cinco anos já haviam se passado desde então. Antonio, o noivo, nem empregado estava à época. Tinha acabado de ser demitido. Trabalhava no canteiro de obras da construção da usina hidrelétrica de Xingó em Canindé de São Francisco. Os serviços haviam parado. Mesmo assim tomou coragem e naquele fim de ano resolvera casar-se. Receberia uma soma considerável da rescisão de contrato. Com o espólio do seguro desemprego comprou, uma cama, um fogão, uma geladeira e uma televisão. Os pais de Maria das Virgens venderam as tarefas de terra do Sítio Baixa do Umbuzeiro que lhe pertencia por herança e isso ajudou os nubentes na compra da moradia própria. Foram ocupar uma casa à Rua Delmiro Gouveia. Daquelas da parte alta, com uma fileira de degraus pra escalar até seu interior. 

Nas noites de inverno dava pra se ouvir a sinfonia dos grilos e sapos nos baixios. O rio Ipanema ameaçava os casebres da ruela de baixo com tsunami cor de café com leite. Pra ajudar no orçamento doméstico Das Virgens fazia sacolé de polpa de frutas. Vendia em casa mesmo, aos estudantes que passavam pra Escola Ormindo Barros. Maria das Virgens terminou o curso de magistério e foi ser professora do serviço público municipal. Antonio passou uma época vivendo de bicos. Foi servente de pedreiro e pintor. Até conseguir, depois de ter feito um curso de segurança, um emprego fixo de vigilante no Departamento de Estradas de Rodagem. Era uma família feliz, as filhas foram aparecendo, e que episódio triste ocorreu àquele casal. Dois marginais invadiram o setor onde Antonio trabalhava e traiçoeiros tiraram-lhe a vida para roubar-lhe a arma. Maria das Virgens ficou viúva, só tendo a si, e suas três filhas.

No dia de natal, pobre viúva, tinha somente as três filhas de companhia. À boquinha da noite, Maria Lúcia começou a sentir umas pontadas nas costas. Após a ceia foi ao banheiro com as mãos nos quadris. Das Virgens, via tevê, ficou preocupada, perguntou se estava sentindo alguma coisa, se queria ir pro hospital. Disse apenas que não. Achava que eram só cólicas e que logo passaria. Não passou, pelo contrário aumentou. Maria do Amparo uma enfermeira amiga de Maria das Virgens estava de plantão no Arsênio Moreira veio até sua casa às pressas. Lúcia acabaria tendo o bebê em casa mesmo. E Maria do Amparo aparou e amparou o bebê de Maria Lúcia, aquela que deu à luz. Um menino, um varão - nasceu quando o relógio da matriz iniciava as doze badaladas - Ganharia o nome de Cristiano.

Bate o sino pequenino
Sino de Belém
Já nasceu o Deus-menino
Para o nosso bem

Maria da Luz era muito pobre morava lá no Bebedouro. Mãe de doze crianças. Seu Ostílio, o esposo, era agricultor. Vivia mais na roça que em casa. Só ia ver a família nos dias de sábado. Levava mantimentos. Parte comprava na feira, parte trazia do Sítio Capim Grosso perto da Remetedeira. A casinha que Da Luz ocupava com os filhos era muito pequena. As crianças, pobres crianças. Dormiam todos num único colchão. Naquela noite de natal, Maria do Rosário uma das filhas de Maria da Luz, uma menina, dez anos tinha. Esperou que todos irmãozinhos dormissem. Ajoelhou-se no chão. Ficara acordada na noite de natal para fazer uma oração. O sino da igreja, o pipocar dos fogos de artifício anunciavam o encerramento da missa do galo. As mãozinhas postas, a menina rezou, pedindo a Deus que o papai Noel naquela noite viesse a sua casa. Viesse trazer presentes pra ela e pros seus irmãozinhos, não precisava ser naquela hora, podia ser depois que ela adormecesse, mas que deixasse uma boneca no chão. Lamentou sua casa não ter lareira, seus irmãozinhos não terem botas para colocar na janela. E foi dormir.

Noite Feliz! Noite Feliz!
Ó Senhor Deus de Amor
Pobrezinho nasceu em Belém
Eis na lapa Jesus nosso bem
Dorme em paz ó Jesus
Dorme em paz ó Jesus

Maria Elisabeth morava próximo ao sítio Vaquejador, duas léguas depois do povoado Olho D’água do Amaro. Conheceu e veio a casar-se com Zacarias. Como viriam a conhecer-se foi dessas coisas chamadas de capricho do destino. Zacarias teria ido a feira do povoado Riacho Grande, comprar umas novilhas para seu pai pecuarista e açougueiro. Ao passar de cavalo por um barreiro resolveu dar de beber ao animal e avistou uma menina com uma bacia na cabeça, indo lavar roupas com sua mãe. Encantado ficou por aquela menina. Não entendia, era apenas uma menina. Voltaram a ver-se numa corrida de argola. Iniciaram um namoro e um ano depois estavam casados. A noite de natal estava bonita estrelada. Uma estrela com um brilho mais intenso veio vindo, vindo e pairou sobre o casebre. Ali nasceu João Batista.

Natal! Natal das crianças
Natal da noite de luz
Natal da estrela guia
Natal do menino Jesus


Fabio Campos

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