Luiza

As manhãs frias de agosto sempre chegam encobrindo de serração os baixios, até o cume das montanhas que circundam Santana do Ipanema. Enchendo duma aura de mistério a natureza das coisas. Isso faz-nos lembrar de Luiza. Morava sozinha, numa única casinha de taipa, quase embaixo dum frondoso pé de Amêndoa que tinha no caminho da Cadeia Pública. Do tempo em que a Avenida Professora Marinita Peixoto Nóya ainda era um grande terreno baldio chamado de Largo São Francisco.

Os meninos iam ao Largo soltar pipas. Naquela época, ali quase inexistia postes, e fiação elétrica. Num passado ainda mais distante existiu um cemitério por trás da igreja Sagrada Família. Falavam os meninos que Luiza era uma bruxa. Motivos havia de sobra pra achar isso, era realmente esquisita. Além de morar naquele casebre, num terreno que fora cemitério, mantinha no terreiro de casa um grande tacho fervente. Atirava a ele, todo tipo de sorte. Desde coisas estranhas a ossos e ervas. Um dos moleques jurava, um dia tê-la visto atirando ao caldeirão um bebê sem vida. Diziam que ela tinha um olho bem no meio da palma da mão.
Professor Maximiliano, nos tempos atuais, saiu lá de Natal, Rio Grande do Norte, prestou concurso no serviço público estadual de Alagoas e foi exercer a cadeira de Filosofia na Escola Estadual Mileno Ferreira. A despeito de que professor de filosofia de louco todos tem um pouco, este não era diferente. Dentre suas excentricidades, dizia que aconteciam coisas esquisitas dentro da casa que ocupava com a esposa, na Avenida Marinita Peixoto Nóya. Falava-nos que a lâmpada do quarto se acendia sozinha, panelas despencavam dos armários na cozinha e o cachorro amarrado lá no quintal, toda noite latia assustado sem ter nem pra que. Mas ninguém dava ouvidos ao professor, afinal uma pessoa que um dia ficara preso esquecido na biblioteca da escola, a princípio não devia ser levado muito a sério.
  
Ainda nos tempos idos, descobriríamos que naquele tacho Luiza fazia sabão, chamado de sabão da terra. Mesmo assim os meninos mantinham distância do casebre. Tinham medo dela e de sua cara de poucos amigos. Sempre trajando longos vestidos de cigana, trazia um lenço colorido na cabeça que escondia seu cabelo. O rosto parecia talhado em pedra, de pessoa sofrida, amarga. Senhoras da sociedade chegavam ao Largo em carros bonitos, vindos de muito longe, pra fazerem consulta esotéricas com Luiza, que tinha fama de cartomante. Teve um dia que adoeci de catapora, e minha mãe foi chamar Luiza pra aplicar benzedura, afim de afastar a febre. Deixou uns galhos de uma planta chamada Samba Caitá pra minha mãe banhar-me. Vieram-me delírios sobre os lençóis, não sabia ao certo se os calafrios eram pelo mal dos cistos cutâneos ou pela presença da bruxa. Em vão tentei ver o olho na palma da sua mão. Tudo que consegui foi ter pesadelos a noite, a ponto de gritar por mamãe sem que conseguisse fazê-la ouvir-me.
Numa noite quente de verão, houve grande alarido no Largo São Francisco, o casebre de Luiza ardia em chamas. Já iam altas as labaredas quando os policiais chegaram ali. Nada mais se podia fazer. Presumiu-se que uma faísca escapou das brasas do fogo do tacho de sabão. No outro dia fomos olhar. No lugar onde havia o casebre, só um monte de barro e alguns caibros carbonizados ainda fumegavam. Talvez temendo maus agouros, ninguém se atreveu revirar pra ver se encontrava o que possivelmente poderia ter sobrado do corpo da cigana. Luiza acabaria virando lenda. Se queríamos meter medo a um colega, dizia: a bruxa Luiza de noite vem te pegar.

O excêntrico professor Maximiliano foi embora de Santana do Ipanema. Professor Maurilo, pernambucano de Bom Conselho, viria pra substituí-lo. Coincidências à parte, o novo professor e sua mãe, uma viúva aposentada, foram ocupar justamente a casa onde morou o professor de filosofia. Ao contrário do colega, este nunca andou reclamando de nada acontecendo ali. Costumava adormecer assistindo tevê. De certo, professor Maurilo acharia muito estranho, se conseguisse permanecer acordado, e percebesse a tevê mudando sozinha de canal. Deixando de transmitir o programa de comentários do futebol e exibindo na tela, uma cena inusitada, bucólica, um largo onde aparecia um frondoso pé de amêndoa, um casebre de taipa e uma mulher de vestido longo e lenço na cabeça, com uma enorme colher de pau, mexendo o conteúdo de um tacho ardente.


Fabio Campos

Xogoió e o Fragla em Capiá

A agenda ficou apertada pra dar conta de tantos compromissos nesse final e início de semana. No sábado aconteceu, a “V Caminhada Homero Malta”. Subimos - eu e mais 27 companheiros - a serra da fazenda Tigre. Naquela bela manhã nublada nos aventuramos a mais essa excursão pelas cercanias de nossa cidade. Ternas lembranças vieram-nos ao rever no pátio da Fazenda Barra do Tigre, o “candango”, apelido do velho jeep que pertenceu ao patriarca da família Silva, o empresário Domício Silva. Em ótimo estado de conservação e funcionando perfeitamente, o “candango” passeou com alguns visitantes pelos arredores da fazenda.

Mais surpresas nos reservavam àquele dia. À noite fomos prestigiar o lançamento do livro “O Marechal que Virou Major” do ilustre escritor, que se auto-intitula “contador de causos” José Peixoto Nóya. O portal Maltanet se fez presente na pessoa do seu diretor José Malta Neto, que instituiu aquele momento como o evento que marca as comemorações dos dez anos de existência do portal.
Antes de ali chegarmos, tivemos o prazer de presenciar na Praça Doutor Adelson Isaac de Miranda, parte da 9ª Mostra Alagoana de Dança. Um espetáculo ímpar. Dançarinos de vários estilos se revezavam em apresentações belíssimas. Chegamos a presenciar dança de rua (street dance, hip-hop), dança cigana, folguedo guerreiro das Alagoas, entre outros. Saí dali lamentando ter que me ausentar de um show tão belo pra cumprir outro compromisso, na AABB.
Não esquecendo que estava acontecendo concomitantemente ao evento da AABB, e da Praça Dr. Adelson, a sétima noite do novenário de Sant’Ana. Evento que muito me emociona quando ao término os fiéis são convidados a entoar o hino à excelsa padroeira de nossa cidade, Senhora Sant’Ana.
Faltava ainda um último compromisso. Pra fechar com chave de ouro, aquele dia maravilhoso, o Baile da Juventude no Tênis Club Santanense. O subidor de serra e suas pernas cinquetenárias, que já dava sinal de cansaço, mesmo assim fomos. Noite prazerosa passamos dançando ao som da Banda Alternativa da cidade de Caruaru. No final, a orquestra encerrou com frevo. Incentivado por Jorge oficial de Justiça, subimos ao palco e prestamos homenagem ao poeta Remi Bastos cantamos o pout-purri de sua autoria: Microondas, Pau D’arco e a Noiva.

Lá no alpendre da Fazenda Tigre, um fato interessante Xogoió relembraria ocorrido com ele e Capiá (o doido de Capiá da Igrejinha), no tempo que estava na ativa como guarda rodoviário federal, lá no Carié, ao qual passamos a narrar:
Uma mulher apareceu no Posto Rodoviário pra dizer que havia deparado com um tarado, ao passar ali no trevo. O primo Xogoió e outro guarda que dava plantão foram ver. Arma em punho, pé ante pé, deram uma batida no local indicado pela mulher, e o que encontram: Capiá dentro duma bueira, calça arriada, se masturbava. O doido, nem se intimidou com a chegada dos policiais, olhando pra Xogoió, ainda praticando o ato libidinoso, revelou:


-Já duas Zé Antônio...Duas!!


Fabio Campos

Festa de Sant'Anna

Mês de julho, a cidade de Santana do Ipanema se veste pra festa de Sant’Anna. Numa efusão de cores, luzes e sons, praças, igreja, e parques de diversão que sorrateiramente tomaram as ruas. Alterando o cotidiano da gente, dos carros, e do guarda de trânsito. Enormes torres de aço em emaranhados brinquedos gigantes. Cavalinhos caprichosamente trabalhados, traspassados do lombo ao ventre por uma barra de ferro, cavalgam o ar, velozes e estáticos no carrossel. Fadas, duendes, ninfas, heróis e monstros ufanos. Ora sorridentes, ora assustadores convidam as pessoas a se embrenharem num fantástico mundo de fantasia. Santanenses de lugares distantes, em seus carros e motos possantes, exibem a si e as suas máquinas barulhentas. As ruas tomadas de gente. Caras antigas e conhecidas, misturam-se com outras mais novas, não tão comuns nos dias de rotina. Um cem número de barracas comercializa quinquilharias, doces, salgados, bebidas e músicas.

Manhã na Avenida Coronel Lucena. Um homem caminha na calçada. Aparenta sessenta anos. É santanense, mas não mora mais em Santana. De volta à terra natal, de férias. Chamá-lo-emos de Renan, muito embora não seja esse seu nome. Os olhos marejados de saudade o denuncia, é um fausto, um poeta, um sonhador. Contempla em derredor procurando encontrar-se em tudo. Tudo o que vêem seus olhos, como se já fora seu. Um dia quando infante tudo aquilo lhe pertenceu. Nasceu e cresceu em Santana do Ipanema. Foi criança na Praça da Bandeira, estudou no Grupo Escolar Padre Francisco Correia. E no velho Ginásio Santana. Tomou banho no rio Ipanema. Melhor, tomou água do Ipanema.

De repente surge um menino. Ele vai adiante do homem. Um garoto de nove ou dez anos. O homem não vê seu rosto, mesmo assim, se acha parecido com o menino, de quando era criança. Quanta semelhança vê entre ele e o menino, de quando tinha àquela idade. O cabelo, a roupa, os sapatos. Acompanha-o com os olhos, enquanto caminha. O menino observa o movimento da Praça da Bandeira, corre até lá. Instintivamente como um anjo da guarda, Renan põe cuidado ao menino, preocupa-se se algum veículo coloca em risco sua vida. Não punha, atravessou a rua são e salvo. Encontra outras crianças, brinca. Renan agora detinha sua atenção a igrejinha de Senhora Assunção. Admirou-se do quanto, tão pouco havia mudado depois de tanto tempo. Meio que incrédulo, se dá conta que não apenas a igrejinha estava igual a tempos de outrora, também o Ginásio Santana. O Grupo Escolar Padre Francisco Correia, a casa das Marques, o consultório odontológico de Doutor Adelson, a casa de Seu Dota, o Pinguim de Seu Nôzinho. O hotel de Dona Beatriz, a bodega de Seu Ozéias, tudo como antes. Torna a olhar pro menino. Ele agora estava conversando com um velho, também vê certa semelhança entre aquele senhor e seu velho pai.

De repente cai em si, queda estupefato: Àquele menino é ele! Àquele velho com quem conversa, é seu pai! Toca-se, pois já não sabe mais o que é real, se ele próprio, ou o que vê. Eles agora vão até o sorveteiro, seu pai lhes compra um sorvete. E aproveita pra engraxar os sapatos. O velho pai do menino, a quem daqui por diante chamaremos de Paulo, cumprimenta “Tota” o engraxate. E chega Quincas sapateiro. Põem-se os três a conversar. Jogam conversa fora. “Tota” fala do seu irmão que estaria com um problema sério, por ter mais de seis meses de aluguel atrasado, numa casinha de taipa que mora, na Rua Professora Josefa Leite. É uma das casas de Dona Sidone Tenório.

“Tota” contaria aos amigos que seu irmão, pra quitar a dívida, acabou vendendo todos os móveis de dentro de casa. Vendeu sua vitrola, duas camas de solteiro e uma de casal. Uma mesa com quatro cadeiras e quase todas as panelas que tinha na cozinha. Ficara só com a roupa do corpo. Mas conseguiu pagar os aluguéis atrasados. E como não ficou com quase nada, entregou a casa de Dona Sidone. Sobrou-lhe o suficiente que deu pra comprar um velho Aerowillis de Zé V8. E “Tota” comentaria: Será que meu irmão vai morar com a família dentro dum carro velho? Foi sim. Ele a mulher e os filhos passariam a morar dentro do velho Aerowillis. Era carro de praça. Pelo dia táxi. Os filhos e a mulher ficavam feitos ciganos em baixo de uma barraca de lona ao lado do muro do Asilo São Vicente de Paula. À noite dormiam dentro do velho Aerowillis.

Dona Elvira, Seu Júlio e Nazinha, tia de Zeca, também moravam em casinhas de taipa de Dona Sidone à rua Professora Josefa Leite, eram vizinhos de Luiz irmão de “Tota” cuja casa agora estava vazia. Do outro lado morava João pintor e Antônio “Camaleão”, mas nenhum destes estava com problema no pagamento do aluguel. Os adultos conversavam e apesar de parecer distraído o menino os escutava. Lembrava que logo abaixo da Rua Professora Josefa Leite, morava Duda Bagnane, e Mirindão, a quem ele e os colegas passavam à porta apelidando, Mirindão era uma velha, e detestava esse seu apelido. E dizia um monte de palavrões, e ameaçava correr atrás dos moleques pra bater com o que tivesse ao alcance da mão.

E Renan ouviu longe a campainha do sorveteiro se afastando da Praça da Bandeira, ia pedir ao pai que comprasse mais sorvete, mas foi se acordando, acordando. Pronto, o despertador o acordou, naquela bela manhã de julho e agora Renan fitava o teto do apartamento onde mora em Aracaju. No criado-mudo os óculos e o celular. No chão a bolsa já feita, pronta pra ir pra Festa de Sant’Anna.

Fabio Campos

Zé dos Santos e "Meu Félo!"

A consagrada Rede Globo tem programas pra todos os gostos. A minha interação com aquele canal de tevê, bem definiria pelo nome de uma de suas novelas: “Morde e Assopra”. Elogios à parte, a emissora tem investido maciçamente em propaganda deles mesmos. Isso devidamente bem assimilado leva-nos a concluir que a emissora vem perdendo, audiência. Parece-nos que estão perdendo a supremacia de estarem sempre no topo. Sinais dos tempos.

Compararia àquele canal de televisão com a bolacha de Zé Lezin. O matuto paraibano, conta no seu último show, sobre uma bolacha chamada em alguns lugares de “Dez por Cento”, noutro de “Suja Casa”. Você mastiga, mastiga, mas só fica dez por cento na boca. Ali você assiste, assiste pra vê se escapa dez por cento.

A Rede Record, a ascendente emissora do bispo Edir Macedo: disputa com a emissora dos Marinhos o campeonato de melhor audiência, pra mim, esta de cá, já é campeã num item: O de criar clichês. Os famosos jargões, inclusive num esforço apelativo tentam resgatar.

Da escolinha do professor Raimundo: “E o salário, ó...”

Do Luciano Hulck: “Loucura! Loucura!...”

Do Faustão: “Ô louco meu...”

Isso fez-me lembrar da “fase de ouro” da Rádio Correio do Sertão. No final da década de setenta a emissora radiofônica da família Bulhões contava com um excelente elenco de radialistas. A exemplo de meu irmão Francisco Soares, Edilson Costa, saudosos: Welington Costa, Titio Guerrera e Adeison Dantas. Também dos atualíssimos (ainda na ativa) Fernando Valões, Rânio Costa e Francisco Coelho. Naquela época apareceu não se sabe de onde, um locutor cheio de Jargões e clichês: Luiz Carlos Mariano era o nome dele. Um locutor de peso, literalmente. Nos seus mais de 150 quilos, enchia de alegria as nossas manhãs. Entre uma música e outra cumprimentava o ouvinte com um irreverente: “Meu félo!”

O locutor de humor fácil, também facilmente fazia amizades. Com isso ganhou a confiança do povo, no comércio de Santana e região. Com a confiança adquirida comprou fiado em tudo que é canto. Em menos de dois meses de trabalho, conseguiu dever a duas pessoas: Deus e o mundo! Depois de dar calote em todos os supermercados da cidade, faltava só um: O mercadinho de Zé dos Santos. Chegou ali deu sua famosa cantada:

-Eu te deixo um cheque pré-datado! Meu félo!

No outro dia, cansado de tantas enroladas do locutor, saudoso Doutor Eraldo Bulhões o demitiu, e Luiz Carlos, foi embora. Zé dos Santos enquanto foi proprietário do mercadinho, exibiu num quadro o cheque de Luiz Carlos Mariano, do famoso “Meu félo!”

Fabio Campos

Graf Zeppelin em Santana do Ipanema

Santana do Ipanema de meados da década de trinta. Tinha por essa época, Doutor Joel Marques à frente do poder municipal. A antiga Intendência ficava no centro da cidade. A rua da cadeia dava acesso ao Bebedouro. Igreja de Senhora Sant’Anna, dum lado o velho sobrado, o casarão azul e branco, do outro. Edificada sobre a encosta do rio, a bela matriz já constava de escadaria. Ruas que desciam pro rio, iam formigando pelas encostas. O casario enfileirado, três empórios, uma escola e uma casa noturna faziam o coração da cidade. Em derredor desse cenário nasceria a feira, no meio do passeio público.

Sábado nublado, de julho de 37. À mesa do Bar Lira D’Ouro, capitão Francisco de Campos folheava o Jornnal do Commércio. Chegava da capital pernambucana, no lombo dos muares dos mascates. Um exemplar do periódico ia primeiro à casa do padre Bulhões, em seguida outro à prefeitura. Depois era vendido na feira. O capitão arqueando as sobrancelhas, por cima dos aros dos óculos, leu para os que estavam com ele à mesa:

“O dirigível Graf Zeppelin chegou ao Recife, pousando no Campo de Jequiá em sua sesquicentenária viagem. Em terra aguardava-o, entre outras autoridades, o sociólogo Gilberto Freire. O professor fez breve discurso sobre o solene momento, comentaria do primeiro vôo daquela aeronave, de Salvador à Recife. Lembraria que naquele dia, 22 de maio de 1930, estaria àquele mesmo local, mais de 15.000 pessoas, e o próprio. Também o então governador do estado de Pernambuco Estácio Coimbra estaria presente. Contou breve histórico da aviação de dirigíveis no Brasil. E que o primeiro brasileiro a fazer o percurso, da Europa para o Brasil, foi o engenheiro Vicente Licínio Cardozo. Aquela seria apenas mais uma, de uma longa carreira de vôos que o LZ 127 Graf Zeppelin ainda tinha a realizar pela frente.”

Jornal à mão, o capitão dirigiu-se até o Paço Municipal. Ali ficou sabendo de uma notícia ainda mais interessante. No telégrafo que funcionava numa salinha anexa ao gabinete do prefeito, o administrador mostrou ao militar, pra que ele mesmo pudesse ler, o telegrama que tinha acabado de chegar da capital do estado:

“Ilustríssimo Senhor Prefeito, Doutor Joel Marques,

Eu, Doutor Osman Loureiro de Farias, governador do estado das Alagoas, levo ao conhecimento de vossa senhoria, que o dirigível LZ 127 Graf Zeppelin, fará no dia 08 de agosto do corrente ano, uma viagem de Maceió até a cidade de Água Branca, consta no plano de vôo que a aeronave sobrevoará a cidade de Santana do Ipanema, estará à bordo por ocasião desta náutica jornada, este que vos dirige esta missiva e comitiva, na data aprazada. Ao tempo que solicitamos que divulgue entre os munícipes, o acontecimento vindouro. Faço saber. Tome ciência.

Tenho dito e assino, Dr:. Osman Loureiro de Farias”

O povo ficaria sabendo da história da passagem do dirigível Graf Zeppelin pelos céus de Santana do Ipanema, nos sermões do padre Bulhões, pelo novenário da padroeira Senhora Sant’Anna. Mas quão variadas seriam as versões criadas na boca do povo. Uns comentaria que em agosto, tido como o mês mais carregado de maus presságios, viria a besta-fera sobre Santana do Ipanema. Outros, ainda mais premonitórios falariam em final dos tempos, da vinda do cavaleiro do apocalipse em forma de nave. No imaginário fértil dos estudantes teriam os alemães, criado uma nave espacial que sobrevoaria o sertão, numa missão secreta. Falariam até num possível acordo entre países. O presidente Getúlio Vargas, teria recebido apoio do governo nazista Alemão, de Adolf Hitler, num projeto secreto e audacioso, pretendia localizar o bando de Virgulino Ferreira “O Lampião” com a ajuda do dirigível Zeppelin.

Não faltou larápios vendendo binóculos falsos, pra o povo observar melhor a passagem da aeronave. Ao Largo do Monumento pra onde um dia Santana se expandiria, foi tido como o melhor local pra se observar a trajetória do objeto voador. O professor de geografia José Rodrigues da Rocha apontava ser pras bandas do Bebedouro o leste da cidade, de onde deveria surgir o aeroplano, naquela direção ficava a cidade de Maceió. O fazendeiro e comerciante, Abelardo Falcão contrataria trabalhadores pra limpar uma área de sua propriedade em frente a capela de Nossa Senhora da Assunção, e construiria uma grande palhoça elevada do solo, onde pretendia vender guloseimas, espumante e quitutes, no dia do acontecimento tão esperado. Cobraria uma taxa pra quem quisesse observar o espetáculo do seu planetário improvisado.

Chegou o grande dia. Diante da polvorosa causada pela expectativa do evento histórico, viu-se o prefeito obrigado a decretar feriado no serviço público municipal. Não tinha como ser aquele um dia comum. A bandeira brasileira foi hasteada no Paço e no prédio da Cadeia. A professora perfilou os alunos diante da escola pra assistirem ao evento, e no momento da passagem, estavam orientados a entoar o hino nacional.

E a cidade quedou perplexa diante da cena. O imenso charuto cor de prata surgido flutuante no céu do Nascente. E foi passando. Passando lentamente por sobre a cidade. Por alguns instantes pareceu Santana do Ipanema, pavorosamente congelada. A lavadeira nas pedras do rio, como se transferida a uma pintura a óleo. O gari estático, no ato de catar o lixo. Os pássaros silenciados em seus gorjeios, como se entendessem e respeitassem o momento solene. Incólume ia a inflada nave no seu vôo, sem carecer de asas. As nuvens branquinhas estáticas. O sol por aquele instante esquecido, deixado de ser rei sol. Ofuscado no seu brilho pela esplêndida cena nunca dantes imaginada. Daqui de baixo, pensavam como seria a tripulação a ocupar o monstro acéfalo. Os soldados à porta da cadeia faziam continência pro imenso projétil em seu trajeto rumo ao horizonte. A cabroeira do cangaço entocado nas malocas dos lajedos, feito calango sardão, temendo que da parafernália voante lhes viesse uma bala ou qualquer outro artefato bélico. E o dirigível foi se afastando, em direção ao poente. Ia pras terras de Delmiro Gouveia.


Fabio Campos

"Fofão" e os Cágados de Doutor Aderval

Nos tempos idos da nossa infância e juventude, as famílias santanenses tinham o costume de ter algum tipo de criação, no fundo do quintal. Isso por motivos óbvios. Ter à mesa um alimento diversificado, saudável, a baixo custo. E que se tinha segurança quanto a origem do que se estava consumindo. Além de ter aqueles apreciadores de pratos exóticos. 

Havia os que criavam por puro prazer, ou para obter uma fonte de renda extra. Sebastião Amaral é um exemplo desse tipo de pessoa. Mantinha em seus quintais verdadeiro jardim zoológico. Aves canoras e exóticas, possuidor de grande variedade. Criava galos de briga. Aos finais de semana os apreciadores desse esporte iam pra sua casa, participar de altamente frequentados torneios de briga de galos. Cães possuía vários, de caça, de guarda, etc. Mantinha ainda criatório de cágados, burguesas, coelhos, etc.

Saudoso Miguel da Barriguda, tinha no quintal, um pequeno criadouro de cágados que seu filho Paulo Roberto, o popular Paulo Ventão, vez em quando, dava um cata. Pra tomar umas com os amigos. Os animais eram levados pra casa de Dona Tereza ( a mãe de Ciro Cícero) lá na rua Professor Enéas, que os abatia, e Mario Pacífico no Bar Comercial, fazia o arremate. 

Ali no Monumento, lembro de Doutor Aderval Tenório, que tinha verdadeira paixão por pratos e iguarias exóticas. Criava no quintal, jias de peito (ou jia de padre, não sei discernir no momento) e também cágados.

No hotel Santanense de Dona Beatriz, lá pelo fim da década de 70, apareceu um maloqueiro das bandas de Carneiros. O peste era tão feio, mas tão feio que se tivesse um irmão gêmeo, o mais feio ainda era ele! O infeliz ganhou da maloqueragem o apelido de “Fofão” por parecer-se com aquele personagem do comediante Orival Pessini, por aí dá pra se ter uma idéia da feiúra.

“Fofão” era encarregado de ajuntar lavagem pros porcos que Seu Zezinho de Dona Zilda, filho de Dona Beatriz, criava lá no Sítio “Escondidinho” na Maniçoba. Por isso, à cata de lavagem, acabava tendo acesso às cozinhas de quase todas as casas, dali do Monumento. Acabaria dando fé dos cágados de Doutor Aderval, ao recolher os despojos de comida daquela residência. Na primeira oportunidade que teve, pulou o muro, e se apropriou indevidamente de alguns cágados. Como não foi dado pela falta, achou bom, e continuou sendo amigo do alheio, no caso a furtar os lentos animais de casco. Irineu começou a notar o desfalque no plantel de quelônios de seu pai. Não faltando oportunidade de se encontrar reunida a maloqueragem do Monumento na praça. Irineu abordou o meliante nestes termos:



-“Fofão” cabra safado! Você está roubando os cágados de papai! Já são mais de vinte que você leva...Agora diga que não foi?!



- Êita mentira! Largue de ser mentiroso Irineu! Não foi nem dez...


Fabio Campos

As Uvas de Doutor Clodolfo

No tempo da infância, de qualquer criança, pelo menos uma fruta, ou mesmo o pé de um vegetal, vai marcar infinitamente a sua vida. Chegamos a tal conclusão, ao ler tantos e tantos poetas, escritores que relatam de suas vivências com frutos e vegetais. Da importância e da influência que tanto causariam em suas vidas: “Meu Pé de Laranja Lima”, “João e o Pé de Feijão”. Se elas, as frutas, ou eles, os pés que produzem os frutos, estiverem ao alcance das crianças, ótimo! Teremos pois crianças realizadas, felizes, e a cima de tudo, mais saudáveis e nutridas.
Diante de tais circunstâncias queremos relatar, de como fomos felizes, ao vivenciarmos tais situações em busca das frutas e dos frutos que embalaram os sonhos de nossa infância. Nascido e criado “como Deus criou batata” - como dizia tão querida e saudosa Dona Marinita Peixoto Nóya – vivíamos, eu e meus colegas a cata de uma estripulia pra fazer. O que incluía a busca por uma fruteira e uma fruta pra consumir, já que são tão essenciais ao fornecimento de energia, e nem sabíamos disso. Detalhe: Pouco importava-nos se fossem tais frutas ou fruteiras, propriedade ou exclusiva de alguém.
As melhores goiabas, aquelas que povoavam nossos sonhos. Obviamente não eram aquelas que nossas mães traziam da feira. Diga-se de passagem, feias e sem gosto. As que mais desejávamos tinham que nascer justamente nas goiabeiras do quintal de Seu Dota. Como desejávamos aquelas goiabas! Como já relatei noutra crônica somente no caso do incêndio da casa foi que podemos fazer a farra e desfrutar de tais manjares.
Um trapiazeiro se agigantava no quintal de Dona Aída Malta, e Seu Bêbe, pais de Homero Malta. Muitos anos depois viraria a casa de Dona Glorinha e Seu Zé Francisco Carvalho (véio Zé) nossos vizinhos na Praça da Bandeira. Trapiá é fruta de menino que não tem o que fazer. Fruta fácil. No popular, fruta de rapariga, que você procura e procura o gosto, mas que de tão fácil de conseguir não tinha graça! Assim como as amêndoas ou castanholas que tem até hoje na frente do prédio da Prefeitura Municipal de Santana do Ipanema.
Nos fundos do grupo Escolar Padre Francisco Correia nascia uns pés de mamão, os maloqueiros da Praça da Bandeira, da década de 70, iam lá, se apropriar do que já era deles. Portanto não era uma apropriação indébita. Comiam mamão de outra fonte de origem, e iam lá fazer uma “obra”. E dos excrementos ali deixados, acabavam fertilizando o solo, o que dava origem a novos pés de mamão. Certa vez a diretora Dona Carmem flagrou, um dos irmãos de Marcos Davi, justamente no ato em que arriava o “barro” fértil. Depois de ter comido vários mamões.
Tamarindos ou tamarinas, como nós chamávamos é fruta cítrica, de encher a boca só de falar o nome. Essas, só tinha graça se fosse conseguidas no quintal da casa das Marques. Uma aventura furtar tais frutos. Pois as quatros tias do prefeito Seu Adeildo: Dona Carmelita, Dona Landelina, Dona Marieta e Dona Marina, queria distância dos meninos naquele frondoso pé de tamarindo.
Naquela mesma época, Doutor Clodolfo Rodrigues de Melo achou de plantar no seu jardim um pé de uvas. Uva naquele tempo a gente só via nos filmes bíblicos: Bem-hur, Nero e o Incêndio de Roma, e por aí vai. Aquilo era uma afronta, aos mais secretos desejos dos maloqueiros da Praça da Bandeira. Na hora de fazer “a pauta” de traquinagens, não faltava o item: “Roubar as uvas de Doutor Clodolfo”. Ele ressabiado pelos permanentes ataques ao seu parreiral, mantinha permanentemente preparado, dois adestrados pastores alemão. Prontos para atacar, o maloqueiro que conseguisse a grande façanha de passar pelos seguintes obstáculos: Muros de três metros de altura com cacos de vidro pontiagudos, uma teia de arame farpado e fios eletrificados. E ainda tinha moleque que conseguia. Ô uva saborosa!


Fabio Campos

As Tias de Adeildo Nepomuceno

A casa das Marques, como era conhecida, ficava à Avenida Doutor Arsênio Moreira. Bem ali, de frente ao Grupo Escolar Padre Francisco Correia. Quatro idosas senhoritas habitavam singela morada. Eram as tias de Adeildo Nepomuceno. Lá do fundo do quintal, frondoso e convidativo pé de tamarindo - dos seus mais altos galhos - acenava pros meninos que escalavam os velhos pés de figos da Praça do Monumento.
Senhorita CARMELITA. Era a que cuidava das plantas. Do jardim ao quintal havia muitas. O pinheiro espichado à cima dos beirais da janela da frente evocava bolas e luzes a dizer: aguardamos natal. Do lado de dentro, uma aura envolvia o visitante, como se uma viagem no tempo haveria de ser proporcionada. Como a um sonho nunca dantes vivido. O feio barulho do trânsito, as cores sujas da rua, distante se faziam, atrás da porta. Imenso quadro do coração de Jesus à cima do sofá. Pra quem trazia o coração exposto ao peito, até que tinha o Cristo, semblante sereno. Os olhos fixos na porta. A mão esquerda pousada sobre a bola do mundo, a destra erguida ao ombro, dizendo, dois. Abajur róseo sobre uma mesinha coberta com renda de bilro fazia par com fotografias em preto e branco, emolduradas - das quatro tias de Adeildo - de antes de tornarem-se doces velhinhas. Portas-chapéus de madeira torneada, uma escarradeira num canto da sala. Espelho de moldura oval no início do corredor. Um tapete de napa ia, da porta de entrada à cozinha. As chinelas de Senhorita Carmelita, fazia clap-clap no tapete enquanto ia atender alguém a porta. Os meninos, por traquinagem, tocavam na campainha que fazia sonoro din-don e ficava longos segundos ecoando pelo interior da casa. Antes da cozinha tinha de um lado, uma área verde. Borboletas, jias e besouros, faziam a festa. Do lado oposto, o quarto das orações. Parte mística da casa, não sendo permitido ali entrar crianças, aumentando ainda mais o mistério. Uma vela permanentemente acesa. Incenso na penumbra. Imagens em gesso de Senhora Santana, de Senhora Assunção, e uma outra de Santa Terezinha do Menino Jesus. Naquele janeiro de 1978, Adeildo Nepomuceno iniciava o quarto ano, de um terceiro mandato. Nunca, desde menino, deixou de ir um só dia, a casa de suas tias. Com tia Carmelita conversava assuntos de família, das preocupações com os filhos. Dizia-lhe da vontade de mandar Roberto pra estudar no Recife e de como fazia dias não tinha notícias de Adeildinho, que morava em Maceió.
Senhorita LANDELINA. Cuidava dos bichos da casa. Um gato angorá e um siamês. Gatos eunucos, obesos, preguiçosos. O velho papagaio - que sabia rezar a ladainha - tagarela avisava se via os meninos furtando os frutos de tamarindo por cima do muro. No quintal, galinhas, guinés e perus retidos num chiqueiro de tela. Ainda de manhãzinha o sol se espreitava por entre a folhagem dos pés de Pinha e Coração-da-Índia, enquanto os mosquitos zuniam por cima das cabeças. Da fazenda Coqueiros, chegava o leite ao lombo do burro. Seu Amaro prendia o jumento na argola de ferro ao meio fio. Adeildo achava tia Landelina a mais espirituosa, engraçada. Se triste, ia ter com ela. Ria feito menino velho, do jeito brincalhão como encarava a vida. Na companhia de tia Landelina voltava o prefeito à infância.
Senhorita MARIETA. Dedicava-se a supervisionar os serviços da cozinha, que tinha mosaicos em tons beges no piso. Até a altura dos ombros, azulejo enxadrezado em preto e branco nas quatro paredes. Belo lustre de pingos de cristal contrastando com o verde claro do teto. Sobre a mesa uma fruteira com pinhas, bananas, maçãs e uvas de verdade. Sobre a geladeira de porta arredondada e puxador engraçado, o solene pinguim apontava o bico pra frente e avante. Nada disso causava mais impressão, que os cheiros dentro da cozinha. Uma essência pra cada momento do dia. Pela manhã bolo de milho, e massa de cuscuz recém moída. Perto do meio dia, cheiro de caldo de carne acompanhado do estalar dos talheres. À tarde a calmaria tinha sabor de doce de jaca em calda, dentro das compotas. E de cravo e canela, dos licores. E a noite o aroma encorpado de café se ia às narinas dos passantes na calçada, levado pela suave brisa que entrava pelos postigos da porta dos fundos. Adeildo se achava parecido com tia Marieta, por ela carinho especial, e a ela confidenciava segredos de estado. Da mágoa de ser acusado no caso Zé Amorim. Diria de nunca ter mandado prender e dar uma cambada de cacete, a um cabra que se meteu a falar mal de sua pessoa. E depois ele próprio ter mandado soltá-lo. Certas coisas - a ele atribuídas, dizia - nem sempre era verdade. Sentado na cadeira de palhinha à sala de estar, o ventre atacado pelo cinto, parecia ainda mais avolumado. Cabeça calva, a baixa estatura, olhar austero. Muito dele, em atitudes e ainda mais fisicamente, lembrava o caudilho Getúlio Vargas.
Senhorita MARINA cuidava ainda mais do lado espiritual dos membros da casa, e da família. Às seis horas da tarde, todos que estivessem na casa deviam ir ao oratório rezar o terço e a ladainha de Nossa Senhora. Ela que fazia as inscrições e o pedido pelo correio, do Almanaque da Fé, depois ia de casa em casa entregar aos paroquianos. Organizava as Cruzadas, e o pastoril por ocasião dos festejos natalinos. Como se não bastasse, ainda gerenciava o Armarinho das Noivas, no comércio de Santana. Zeladora-mor da capela de Senhora Assunção, era que acendia as luzes da igrejinha. No mês de agosto pelo novenário da santa, tocava o sino às seis da tarde. Zuza fogueteiro fazia subir ao céu os fogos enquanto os meninos corriam a pegar as varetas fedidas a pólvora queimada quando caiam.
Adeildo Nepomuceno foi ter com as tias. Os últimos dias tinham sido corridos, apertados. Ao menos ia cobrar-lhes as bênçãos naquele domingo. Euforia duma prévia carnavalesca, no Tênis Club Santanense. A tia Marina parecia pressentir que algo não ia bem com o sobrinho. Chegaria com ar preocupado. O motorista aguardaria no carro. Conversa rápida. Despediram-se à porta. Ela recolheu-se a orar. A viatura da polícia passou pela Praça da Bandeira fazendo alarde. Não passava ainda da meia noite. E a notícia fatídica ainda naquela madrugada começou a espalhar-se. Tinham acabado de matar Adeildo Nepomuceno na fazenda Coqueiros.


Fabio Campos

Cordel do 13º Reencontro

Dez jovens do Monumento
Tomaram bela atitude
De se encontrar todo ano
Na festa da Juventude
Aninha, Carmélia, Cleide
Gorete e a prima Glória
As cinco e mais outras cinco
Se não me falha a memória
Luiza Núbia e Rosiane
Selma, Zânia e Jussara
Se encontraram a 13 anos
Pra se recordarem das farras
Das festas da Juventude
Dos tempos de colegiais
Do “Padre Francisco Correia”
Ninguém esquece jamais
Bela Praça da Bandeira
De Senhora Assunção
Querido Ginásio Santana
Nosso velho casarão
Hoje se reencontram
Jovens, velhos e senhores
Já são tantas gerações
Lembranças mil multicores
O grã-Poeta Remi falou
“Santana dos meus Amores!”
O Reencontro cresceu
Já é parte da nossa cultura
Já está incorporado
Aos festejos da Prefeitura.




Fabio Campos

A Bala que Matou Caim?

Mais uma vez os trabalhadores da Educação de Santana do Ipanema pega sua cruz e segue. Os professores da rede municipal e pessoal de apoio, a exemplo do que ocorreu com os trabalhadores da Educação do estado de Alagoas, inicia mais uma luta por reconhecimento, valorização dos seus serviços prestados, de salários defasados. Da aprovação do Piso Salarial Nacional. De reconhecimento nesta luta que é insana.

É luta árdua. Como se não bastasse, são os que fazem educação nesse país motivo de chacota. Uma senhora que se dizia professora que apareceu inicialmente na internet, depois em rede nacional se dizendo defensora dessa causa na verdade não passava de uma correligionária de um partido político tentando atrair a atenção. Teve seu momento de fama.

E nós? Educadores de verdade? Que estamos e continuamos, todos os dias realmente no batente? Na sala de aula correndo muitas vezes riscos de vida. Há uma espécie de cultura espalhada aos quatro ventos: “TUDO PARA O EDUCANDO!” É uma maldita cultura da permissividade em detrimento do vilipêndio de valores morais. De uma completa extinção dos valores morais, sociais, cristãos e do respeito ao mais velho e ao profissional seja qual for a função que se exerça. Isso existia no tempo dos nossos pais.

Não tem quatro décadas havia respeito aos mais velhos: Fosse ele pai, professor, engraxate, varredor de rua. Havia a cima de tudo respeito! Os mais novos respeitavam os mais velhos.Hoje infelizmente vemos e ouvimos pais dizendo que não “podem” mais com os seus filhos. Sobra pra quem? Nós educadores? Sociedade? Hoje em dia o que vemos é uma espécie de: VAMOS DIZER UMA COISA E FAZER EXATAMENTE OUTRA! A exemplo das propagandas do governo “enfeitando a baiana” uma propaganda enganosa( e milionária!). Querendo passar a idéia que a sociedade deva valorizar o professor, aí vem com musiquinhas e gingles. E na prática o que vemos, um Piso Nacional que passa cinco anos(desde 2006) tramitando no Congresso Nacional e no Senado Federal. Finalmente é aprovado, reconhecido, sancionado pelo presidente e pasmem: Simplesmente não se cumpre! Ninguém está nem aí se é lei!

Isso mostra como infelizmente não temos políticos sérios. Não temos opção em quem votar. Votamos nos menos ruins. E pior! Elegemos por pura revolta analfabetos pra legislar e executar leis neste país do “faz-de-conta”. Como fizeram com o palhaço Tiririca. Não sabe nem assinar o nome. E olhe que é presidente da Comissão de Projetos para a Educação! Pode?

Em Santana do Ipanema, não é diferente. Outro dia, um vereador desta atual gestão, que faz oposição a atual administração do poder executivo Dra. Renilde Bulhões. Ao fazer uso da tribuna. Pra dizer que nada o intimidava, teria dito:

-Ela tá pensando o quê? Que é a bala que matou Caim?


Fabio Campos

Poço dos Homens

Lá vinha o Ipanema, de águas salobras cor de ferrugem, pra dá nome à cidade. Surgido no largo da barragem vinha se chegando, descendo vagaroso, feito imensa jibóia no leito de si mesmo. No poço do Juá, se alargando tomando aspecto dum lago, e tornando a afunilar, pra chegar ao poço dos Homens. Em tempos imemoriais, bem ali, ficava arredio, fazia redemoinhos. Tornava-se profundo, misterioso.

Dia de feira a encosta ficava coalhada de carros de bois. Ao lado direito do largo, a casa do padre Bulhões. Velho casarão de linhas sóbrias das construções do início do século passado. Imensa varanda ornada de samambaias. Ciprestes e musgos escalavam as muretas, dando um toque ainda mais bucólico à edificação, concebida no batente do riacho. Justo no ponto onde o Camoxinga, vai desaguar no Ipanema. Na bifurcação das águas, a imponente moradia do padre e rude ponte de madeira a dar acesso aos passantes que vinham do noroeste da cidade.

Poço dos Homens, porque carecia de coragem e força nos braços pra se aventurar naquelas águas. Os canoeiros aproveitavam a mansidão das águas um pouco mais a cima, e fazia a travessia dos viajantes que seguiam pra Pão de Açúcar. Uma balsa, feita de troncos de mulungu e tonéis de querosene calafetados, baldeava caminhonetes, e graciosos carangos de passeio. Quatro pares de braços fortes manejavam os remos que impulsionavam a embarcação até a outra margem do rio. Poço dos Homens olhava das pedras o vai-e-vem de outros homens, seguindo suas vidas e seus destinos. Mulheres lavavam roupas e tomavam banho, lá longe, afastadas dali. Poço dos homens, e dos meninos afoitos que mergulhariam para sempre suas vidas e seus destinos no mais fundo de suas águas, pela arrogância de tê-lo desafiado. E quando as águas das cheias abaixavam, pescadores iam tentar resgatar os corpos sem almas, deixadas pra sempre no fundo do poço. Dona Mãezinha trazia uma criança que ainda não tinha pecado grave, e fazia com que soltasse na correnteza do rio, uma vela acesa, apoiada na lasca duma cabaça. Dizia: o quengo vai ficar boiando onde o corpo do afogado estiver!

Diziam os mais velhos, a maior cheia que o rio já dera, teria banhado os primeiros degraus da matriz de Senhora Santana. Já faz tanto tempo e poucos são os que sustentam que realmente tenha acontecido um dia. A igreja matriz nem tinha ainda a majestosa torre que hoje possui. Bem como inexistia o casario que compõe a parte de baixo da rua do comércio. O que havia era um enfileirado de casas, alternadas por alguns sobradões seguindo na parte mais alta da encosta até o Bebedouro, de onde a cidade se esticou. Isso é do tempo em que os homens influentes da cidade, trajavam terno de linho e chapéu de massa e as mulheres vestiam longos vestidos, cheios de babados e anáguas.

Contam que por essa época, no casarão que fica ao lado da igreja matriz, pras bandas do Mercado de Carne, morava um importante comerciante chamado de Ariovaldo Nunes Lisboa, casado com Sinhá Leopoldina Nunes Lisboa. O casal tivera duas filhas, Maria das Mercedes e Maria do Bom Parto. Trabalho pra vir ao mundo, teria dado esta de cá. Na hora da concepção, estaria enlaçada pelo cordão umbilical. Dona Mãezinha parteira teria pedido a sua tia Teodora, pra fazer promessa a Nossa Senhora do Bom Parto: se mãe e filha escapasse, teriam que dar o seu santo nome àquela cria. As meninas acabariam separadas do convívio. Mercedes seria criada pelos seus pais e Maria do Bom Parto pela tia.

Maria das Mercedes fazia parte do coral da igreja. Tinha aulas de latim e música com o padre Bulhões. Ajudava na catequese de crianças e sonhava em se tornar uma religiosa. Integrava o grupo de devotas senhorinhas zeladora da igreja. Maria do Bom Parto seguiu exatamente o caminho oposto. Tinha aulas particular de francês, queria aprender balé, gostava de carnaval, fumava escondido dos mais velhos. Com as colegas de escola criou um grupo de teatro. Um dia quando ainda criança, se inventou de comer cabelouro atrás da porta, pra ver se ficava bonita, feito a irmã.

Certo rapaz de nome Ismael Constantino, por incentivo da família do padre, havia se tornado coroinha. Conheceu Maria das Mercedes e pela moça teria se apaixonado, que infelizmente não correspondera àquele amor. Foi numa tarde chuvosa, do mês de julho, quando já se haviam iniciados os preparativos para as festa da padroeira Senhora Santana. Depois do ensaio dos cânticos, no salão paroquial, Ismael ao ver-se sozinho com Mercedes, acabaria por violentar a moça. A jovem sem revelar o que lhe havia ocorrido, caiu em profunda depressão, e não demoraria, viria a falecer. O tempo passou. Ismael ao atingir a maioridade deixou de ser coroinha. Tornou-se fiscal da intendência. Não demoraria muito na função, partiria pra capital do estado. Dez anos depois voltaria a Santana do Ipanema, já formado, anel de bacharel no dedo, tornado escrivão da polícia. Resolveu finalmente casar, para tanto desposaria a professora Maria do Bom Parto, a filha de criação de Teodora Barros, e do ilustre capitão Galdino Barros que morava no outro lado do rio Ipanema.

Capitão Galdino e Sinhá Teodora moravam na única casa descente à outra margem do rio. Num maciço de barro vermelho, chamado de Cachimbo Eterno. A casa de respeito tinha traços de gótico nos umbrais, cachos de pêssegos no arremate dos oitões. E cordões sinuosos nas beiras que desciam pelas pilastras. Os portões de ferro trabalhado, e os portais em madeira chanfrada. A casa cuja frente olhava pra Santana, ficava ao lado da estrada que dava acesso ao vizinho município de Pão de açúcar. Mais adiante, subindo a encosta, uma fileira de casebres, fazia a nobre morada do capitão, parecer uma rainha rodeada de pobres súditos. À noite, uma malha de pontos de luzes amarelada dos candeeiros, dentro das casinhas dos pescadores, contrastava com a vistosa luz prateada, dos bicos de gás que alumiava a casa do capitão.

Ao chegar de determinada viagem da capital, numa noite de inverno, Doutor Ismael deu de querer atravessar o rio. Era fria noite de julho e chovia. O rio mais e mais tomava água. Nunca o balseiro se arriscara em tal empreendimento e em tais condições. O escrivão e sua teimosia de causídico muito queria rever a esposa, havia dias estava afastado. Trazia rica prataria, uma fortuna em jóias, dobrões de ouro da capital. Queria que se alegrasse com os presentes de recém-casados. Depois de muita discussão, venceu a rudeza da autoridade, contra a bruteza do experiente homem do rio. Iniciaram a travessia, enquanto isso o rio crescia. Mal chegariam à metade do percurso, e o monstro dágua deu a demonstrar toda sua ira pela afronta daqueles reles mortais a desafiá-lo. E aquele ponto disforme no meio da correnteza, aos poucos foi sendo tragado pela imensa massa de água, em meio à sinistra escuridão de breu aterrador. A chuva tornada um dilúvio de vento e fúria arrastou a frágil embarcação pro fundo. No outro dia ainda chovia. Debaixo de um negro guarda-chuva, lá ia Dona mãezinha descendo em direção ao Ipanema, uma criança a tiracolo. Iam largar nas águas, uma cabaça com uma vela acesa. Pra ir encontrar o corpo sem alma de Doutor Ismael dentro do poço dos homens.


Fabio Campos

Compadre Quincas e o Cavalo Branco

Tem gente que tem a mania de ser entendido em determinado assunto. Louvamos pessoas que detém conhecimentos sobre determinado tema e sobre ele deita e rola cultura. E tem um tipo de pessoa que não é entendido em apenas um assunto, simplesmente ele entende de tudo! Estou a referir-me ao cabra que toma cachaça. O bêbado. O homem ébrio. O popular c... de cana! Devido a sua condição de embriaguez, incidentalmente ele passa a se apropriar de muita cultura. Como se a cachaça o tornasse um homem culto, detentor das “sete ciências”.

Convidado que fomos a uma festa de aniversário no final de semana. Estivemos nos congratulando entre amigos, e tivemos a maior prova do que afirmamos à cima. Pra começo de conversa: praticamente inexiste a conversa, até que se tenha ingerido a “água que passarinho não bebe”. Depois que o peste do álcool destrava a língua, aí pronto acaba o silêncio. Basta alguém arranjar um mote, um tema! E isso é o que não falta num momento como esse.
Alguém comentou sobre a Seleção Brasileira de Futebol, mas logo o assunto morreu por falta de interesse. Comentou-se a morte de Itamar Franco mais ficou só nisso, um comentário. Festas Juninas, Festas da Juventude, violência na cidade de Santana do Ipanema. Não! Nada emplacava! Uma mente mais “brilhante” (talvez um pouco menos sóbria que as outras) puxou o assunto sobre, que motivos levam as pessoas a “tomar uma”! Pronto! Taí um assunto que por unanimidade foi tornado interessante! Comentou-se de como o frio é auto-sugestivo e que desencadeia no organismo a vontade de praticar o esporte preferido do pingunço, o Arremesso de Copo com Líquido Inflamável à Boca.

Destilados e fermentados passariam além de ingerido, a voltar da boca em forma de palavras de elogios e loas aos efeitos proporcionados a cada um. Entre “uma” e “outra” iam os amigos contando das peripécias que um dia haviam cometido, por conta do consumo exagerado do néctar dos deuses e sua parentela. De quando descumpriram a velha regra que vem no rótulo que diz “Beba com moderação”.
Teve aquele que e acordou embriagado e mijou na geladeira pensando que estava no banheiro. Outro que acabou dormindo sentado na privada. Outro que “arriou o barro” no pé da cama, pense no fedor dentro do quarto no outro dia! Por motivos éticos (fiquem sabendo que existe ética no meio etílico!) a estes omitimos os nomes de seus autores. Porém a história de meu compadre Quincas, essa tenho certeza ele me autoriza contar.

Compadre Quincas, não sei se seu nome é Joaquim, sei que trabalha de vigilante na agência do INSS de nossa cidade, Santana do Ipanema. Dizia ele que foi a determinada festa mais nosso amigo Mario Holanda que já fora gerente da referida agência. Na dita festa, de bebida, só foi servido um tal de whisky cavalo branco, e tinha o equino estampado na caixa. Diz ele que passou a noite tomando o whisky, foi pra casa “pisando em rolimã”. No outro dia quis saber sua patroa:

-Ô Quinca que peste tu bebeu na farra esta noite?

-Por quê?

-Homem! Eu quase não durmo com você, pêidava, dava coice e relinchava!

Fabio Campos

Posso Ir no seu Blog?


Quem tem e-mail naturalmente já deve ter recebido de algum amigo determinada mensagem, pra lá de interessante: um texto construído totalmente com letras embaralhadas mas que conseguimos tranquilamente ler sem nenhum problema. E sem que percebamos termina a mensagem dizendo que se trata de um artifício da nossa mente, que lê decodifica em fração de segundos e se “encarrega” de desembaralhar as letras. Isso é fantástico!

É a capacidade que tem o ser humano de reagir a informação que chega a sua mente. Pra cada ação uma reação. O que vimos essa semana: a um só tempo um juiz de Direito casando um casal de gays, imediatamente outro anulando a união, se fundamentando no princípio de que aquela união não geraria prole.. O que culminou com um casamento coletivo entre gays no Rio, e a Parada Gay na maior avenida do país, em São Paulo. Com a participação de mais de quatro milhões de pessoas. Nem as Diretas Já, Nem o papa João Paulo II, nem Barack Obama reuniu tanta gente! O que é isso meu Deus? Precisamos urgente rever nossos conceitos. Os valores fundamentais da família não podem nem devem ser relegados a segundo, terceiro ou último plano.

Em meio as festividades juninas, outros valores continuam firme e forte. Ao entrar no supermercado Ouro Branco, nos deparamos com o amigo Roso, grande sanfoneiro de nossa querida Olho Dágua das Flores, animando os fregueses, cantando Luiz Gonzaga e fazendo a sanfona gemer. Benício Guimarães encontrei na Toca do Pato, mostrando seu mais novo trabalho, em uma das faixas do novo CD, canta e enaltece praticamente todas as cidades do sertão e agreste alagoano.

A um vendedor de CD no meio da rua, comprei o mais recente trabalho de Zé Lezin, com “A Saga de Um Matuto”. Trata se de um apanhado das piadas contadas em um velho Cd . Apenas deu uma melhorada numas piadas e maquiou outras. Novidade? Só Jackson do Pandeiro no Som Brasil da Rede Globo! Esse vale apena perder um pouquinho o sono e assistir! Outra novidade é que agora nós temos um blog. O chato é, depois que espalhamos a notícia, ter que ouvir os amigos perguntando:

E aí...Posso entrar no seu Blog?


Fabio Campos