
No frontispício imenso portal, frisado
em duas arcadas ogival, ostentando um querubim a arquivolta. As folhas das
portas, quase sempre serradas, trazem duas janelinhas de vitrais ovóides, como
se os dois olhos da igrejinha, olhando. A
escadaria tinha história só sua. Depois da carnificina de Angicos, teria
servido pra expor as cabeças dos cangaceiros, trazidas pra Santana. Testemunha
plena de tantos episódios. Desfiles cívicos, certames de atletas, motos,
carros. Passeatas, bandas e clarins - feitos sublimes – Procissões, folguedos,
troças de carnavais - fatos históricos - Comícios, manobras militares,
movimentos grevistas, féretros. A tudo presenciou. Inspirou artistas,
cancioneiros, pintores e poetas:
Aberta ao público a capelinha,
novo cenário pros olhos doa! A imagem da virgem Santíssima resplandecente entoa!
Bálsamo, refrigério pras almas suplicantes! Senhora Nossa na glória radiante! Seu
olhar sereno, volvido aos céus. Azul e branco suas vestes e véu. Assenta os pés
a nuvens risca d’anil. Esmagando a cabeça da serpente vil. Anjos e querubins
dizendo: - Ó! E a lua crescente ao arrebol. Castiçais e jarros, velas e óleo, remetendo-nos
a visão de um oratório.
Se agosto, as festa de Nossa
Senhora Assunção. O altar sob um batente de mosaicos erguido ornamentado até o
cleristório. Às novenas, átrio tomado pelo povo. Charola formosamente enfeitada
de flores, enchendo de largo o perfume de flores. Majestosamente tornado cheio
de alegria, e de louvor o paço. Explosão dos fogos, vibrantes floreios de entre
os cânticos. No seu interior talvez mal desse pra acomodar seis fiéis, ao
presbítero. Guarnecido de colunas, púlpito e capitel. Contrafortes pares em
estilo gótico remetendo ao trifório. Lá da praia dava pra ouvir:
“Salve ó virgem da Glória
Por vosso povo foste escolhida
Para nossa padroeira
Abençoai-nos ó mãe querida
Ó Glória de Nossa terra
Velai por nossa cidade
Que a vós foi confiada
Protegei-nos ó mãe de bondade”
Antes mesmo de ser, e crescer o menino, Nossa Senhora conhecia seu
destino. Um dia partiria, Ela já peregrino o sabia. Estaria sempre presente a
protegê-lo, pois nascera sobre sua égide, por isso o zelo. Grupo Escolar Padre
Francisco Correia e Nossa senhorinha rezando, depois Ginásio Santana, e Ave
Mariazinha velando! Ora partia, pra longe do natal abrigo. Sem que soubesse santa
Mãezinha ia contigo! No litoral também Ela a Rainha que no altar o povo a tinha.
Venerada pelo povo do mar, gente do labor na cana, gente embrenhado da mata. Cheiro
de antigamente e maresia em tudo havia. De causos contados com espanto, de
constantes chuvas que molhavam até os ossos, de mulas e tropeiros resvalando no
barro encharcado. De ruas enfadadas, que ainda dormiam e tinham sonhos
coloniais, debaixo do sol, sonhavam com cartas vindas da corte, enviadas por El
Rei! Capitães e jesuítas se foram, mas deixaram seu legado. Tesouros enterrados
na praia, pra resgatar depois da revolução. Rua da Salina, erguida sobre uma
gleba pertencente ao acerbispado, espólio de Nossa Senhora da Piedade. Assim
diz a data, ainda na velha fachada em estilo barroco: “fundada em 1603”. Donatários
Cunha e Lima, agraciados pela coroa portuguesa, deixaram posses à posteridade. O
usineiro, extemporâneo da herdade, firmou compromisso com a Santa, promessa de
família pela saúde restabelecida. E soergueu o que em ruínas estava. Novo
púlpito, novo altar. Fez nova a catedral. De velho só o padre. Ia a procissão,
de povo agradecido a mãe da Glória, ia o povo, uma só família, o tirador de
coco milagrosamente sustentado pela peia evitando a queda fatal, o barco
pesqueiro a deriva, encontrado dias depois. Ela olhava por todos eles.
Senhora Assunção, Senhora da Glória. Milagres concedidos na praia,
também no sertão. Seu Zé Santana, no passeio de toda tarde, subia os degraus da
igrejinha, fechava os olhos, encostava a cabeça na porta da igreja, e rezava, e
a dor de cabeça passava. A moça com sudorese excessiva nas mãos. Ensinaram-lhe,
se passasse as mãos na parede da igreja ficaria curada. Passou e ficou.
De navio, veio a imagem da santa, de Portugal, até o cais do porto de
Jaraguá, em Maceió. De trem levada a Viçosa. Sobre o lombo de mulas chegou a
Porto da Folha, de lá trazida a Santana do Ipanema, mas isso é outra história.
Fabio Campos
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