Olhando as águas do rio que lentamente seguia seu caminho,
Isachar viajava no tempo. Tempo em que tinha tantos amigos. E se inventaram de
formar uma banda de rock, tinha a aprovação dos pais. Na garagem de casa
aconteciam os ensaios, quase sempre a noite. A mãe dizia, se não atrapalhar os
estudos, nada tinha contra. Uma megera vizinha, não gostava do barulho. Certa vez, ligou pra polícia, queria garantida a lei do silêncio. Mas ainda nem passara
das dez da noite. Mesmo assim o ensaio foi cancelado. A viatura parada no meio
da rua, as luzes vermelha, curiosos querendo saber o que havia. O policial irritado por ter que vir fazer tal abordagem, fez ameaças. Os meninos revoltados com a denúncia da velha. Uma hora daquela ainda iriam tomar satisfação com ela.
Isachar, num quarto de pensão. Uma cama velha de forros
encardidos, por não ter a onde ir, aquela noite passaria ali. Os amigos se foram.
Depois de um dia inteiro perambulando pela grande cidade litorânea, cidade das
águas. E foram a tantos bares, e casas de amigos. Tanto se divertiram, riram bastante, ora de
táxi, ora a pé. As ruas, ora cheia de gente, ora vazia. E a noite veio. Solidão, na rua das árvores, só o gari e o vento frio. A
última dose, foi daquele uísque que jamais esqueceria. Gosto de fruta rara,
tâmara, ou damasco? Lembrou do vinho tinto tomado de baixo do sol quente, em
cima do caminhão com a carga de tijolos,
encomendada pelo tio, para a reforma da casa de varanda do alto da Boa Vista. E veio a noite, com
ela a melancolia, já era tarde, todos se foram. Preferiu ficar sentado no chão do quarto de pensão,
as costas encostadas na parede, a cama causava-lhe asco. Pensou, nos tantos que
dormiriam ali, e fizeram sexo, sem que aqueles lençóis tivessem sido trocados
Havia barulho de festa, vindo dos corredores. Percebeu o clima, não demoraria
pra que uma contenda se iniciasse. Era sempre assim, nesses inferninhos. Tiros, gritos,
pessoas correndo. Uma pausa, finalmente o silêncio.
De repente seu pai entrou no quarto, Olhando assim de onde estava, no
chão, o pai parecia um gigante. A péssima luminosidade vinha do bulbo de
lâmpada pendido do teto. O pai permanecia de pé, sem nada dizer, apenas fitava-o,
calado, sereno. Isachar percebeu que aquele homem de pé ali na sua frente, não
era seu pai. Era ele mesmo! Só que bem mais velho. Como podia, ele próprio lhe aparecer, assim de frente. E mais, estando numa idade avançada.
As lembranças ficaram ainda mais vivas, do tempo da banda
de rock. Num dia que foram convidados a animarem a festa de conclusão de curso,
da turma da escola. Gioconda se envolveu numa briga, ela e alguns amigos. Briga
feia, de se engalfinharem e mais gente se envolvendo. A polícia teve que
intervir, e quase acabar com a festinha. Estavam todos bêbados, rolou um
baseado no banheiro. A confusão começou no palco, Aldo, o baterista e Reno o
baixista, discutiram feio. Gioconda era o pivô da discussão. Isachar jamais
esqueceria aquela cena. Seus pais chegando apreensivos.
Gioconda rolando no chão agarrada nos cabelos da namorada do baixista. Enquanto
a amiga do baterista lhe segurava pela cintura. Isachar nesse dia, apanhou duas
vezes. Levou uns sopapos ao se envolver na briga da irmã. E levou umas tapas
do pai, por deixar a irmã ficar bêbada daquele jeito.
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